domingo, junho 28, 2015

Victoria tinha 2 corações... - Conto



Viver viajando pela Espanha com a desculpa verdadeira de que é preciso vender os vinhos que o pai produz, ajudou Victoria a conciliar o amor de Paco com o amor de Tiago.
De segunda a sexta viajava, mas procurava dormir sempre em Madrid, onde Paco lhe esperava com todo o amor que havia nessa vida.
Nos finais de semana, voltava carinhosa e cheia de dengo para os braços de Tiago, na bela Barcelona.
As duas cidades rivalizavam até nisso...
Para evitar confusão, chamava os dois de amor, amorzinho, paixão, nada pessoal.
Também tomava o cuidado de quando comia algo diferente com Paco, corria para comer a mesma coisa com Tiago.
Vai que por engano cita alguma experiência gastronomica trocada...
O celular tinha devidamente dois chip's que eram sempre devidamente escolhidos de acordo com o dia da semana.
A desculpa era que como estava em trânsito, era melhor que ela ligasse.
Tudo muito bem planejado, mas nada programado dentro da cabeça de Victoria.
O caso é que ela amava os dois.
Me faz lembrar o clássico de Truffaut: O homem que amava as mulheres.
Ela amava os dois homens com a mesma intensidade, a mesma admiração, o mesmo tesão...
Impressionante como se derretia para cada um dos dois.
Era sorridente, bonita, tinha brilho nos olhos.
Tudo andava como planejado, não fosse o tal de whatsApp...
Num sábado ensolarado, na praia de Sitges, Tiago foi pegar um cigarro na bolsa de Victoria e viu que o telefone tremia como um atacante na hora do pênalti.
Teve que olhar.
As palavras que leu eram muito difíceis de digerir e Tiago nem esperou pela volta de Victoria.
Pegou um ônibus e sumiu do mapa.
Victoria ficou desesperada e só não chamou a polícia porque percebeu que as mensagens de Paco tinham sido lidas.
Chorou compulsivamente.
Voltou pra casa, tomou um banho, pegou as roupas e foi direto pra Madrid.
Paco não entendia nada, mas tentava acalmar Victoria que parecia em estado de choque.
Ela parou de comer, parou de trabalhar, quase não falava e só procurava alguém que lhe desse notícia do amado Tiago.
Paco foi muito bom pra ela.
Pelo menos até o telefone tremer de novo e dessa vez ele ler o que o tal WhatsApp tinha a dizer.
-É muito duro viver sem teu amor Victoria, mas não suporto essa situação. Deve estar a muitos anos com o tal Paco...
Paco leu a mensagem e entrou em parafuso.
Fuçou mais e descobriu mais coisas.
Pegou o carro e sumiu sabe-se la pra onde.
Quando Victoria percebeu o que tinha acontecido pegou as roupas, o carro e voltou para Barcelona.
Se fechou no quarto e abandonou as vendas, o celular e de certo modo a vida.
Não fazia mais nada.
O pai precisou encontrar outro vendedor.
Tiago só apareceu para buscar suas coisas, mas não conseguiram se falar. Trocaram olhares duros e dóceis ao mesmo tempo.
Paco fez um escândalo danado em Madrid.
Nunca mais apareceu.
Victoria escreveu um livro contando a história, sem que ninguém soubesse que era ela mesma a personagem, e acabou ganhando uma fortuna.
Explicava como era possível amar da mesma forma dois homens.
A mulher que amava os homens, ficou sozinha.
Trabalhou, voltou a viver, voltou a comer, voltou a vender vinhos, mas nunca mais voltou a sorrir...
Quando soube da história, com tantos detalhes só consegui lembrar da frase de Chaplin:


O vinho e a pintura - Maurizio Rinaudo

O italiano Maurizio Rinaudo é pintor e escultor.

sábado, junho 27, 2015

Bruno espera Roberta. - Conto




-Ciao amore. Ti amo ogni giorno di più...
Era uma despedida normal.
Bruno trabalhava nos vinhedos, enquanto Roberta trabalhava num banco em Milão.
Se encontravam sempre que possível e era sempre um sonho.
Era uma despedida breve. Pelo menos era o que pensava Bruno.
No trem até a toscana, Bruno como sempre pensava em Roberta.
Chegou em Lucca, pegou o carro e seguiu para o trabalho.
Roberta na cabeça, como sempre.
No final do dia, cansado, procurou Roberta.
Nada.
A noite foi longa, sem pregar os olhos.
Não conseguia entender o que tinha acontecido.
Lembrava de algumas conversas, que Roberta poderia não ter gostado, mas nada era pra tanto.
O dia nos vinhedos foi terrível, era época de poda verde e a cabeça e parece até que os olhos estavam em Roberta. Ele parecia ver o rosto doce, os olhos preocupados, o olhar carinhoso...
Roberta não era de se expressar muito bem, por isso, qualquer palavra mal colocada poderia ser uma tragédia em sua cabeça.
Pensamentos trocados, embaralhados...
Bruno tentava ligar.
Roberta visivelmente queria sossego.
Sossego momentâneo???
Não havia modo de saber.
Bruno fazia tudo e mais um pouco por Roberta.
Isso por um lado trazia tranquilidade e leveza na consciência e por outro preocupava muito mais.
O que teria incomodado Roberta?
Depois de 3 dias conseguiu falar, mas nem isso trouxe a paz que esperava.
Roberta tinha voz triste, mas não era mais a Roberta de Bruno.
Pedia tempo para pensar.
O que significa tempo pra pensar hoje em dia???
Todo mundo sabe não é mesmo?
Bruno também.
O jeito era esperar o tempo.
As uvas amadureceram bem.
A colheita correu sem nenhum problema.
Veio o inverno.
Os vinhedos descansaram.
Neve.
Frio.
Os vinhedos choraram na época certa. 
Bruno chorava diariamente.
Os brotos apareceram.
O ciclo dos vinhedos seguiu normalmente.
Nem sinal de Roberta.
Bruno parecia esperar que o telefone tocasse a cada segundo.
Nunca desgrudava do celular.
Hoje já se passaram 3 colheitas.
O celular continua grudado em Bruno.
A cabeça continua em Roberta.
Bruno acostumou a dormir menos.
Acostumou a trabalhar mais.
Acostumou a ocupar o dia e a noite mal dormida.
Mas não acostuma sem o carinho de Roberta.

O vinho e a pintura - Gianni Pascoli

Gianni Pascoli é um artista italiano, nascido em Savona, mas é de origem friulana.

sexta-feira, junho 26, 2015

Foie Gras é proibido na cidade de São Paulo. Acho que faltam problemas em Sampa...



Nunca ouvi dizer que galinhas, porcos, vacas ou qualquer outro animal criado para consumo humano seja criado como um animal de estimação.
Não vejo nenhuma diferença.
Criam como se estivessem fabricando um produto qualquer.
Ambientalistas acharam por bem pegar no pé do Foie Gras por causa da alimentação forçada que patos e gansos são submetidos antes de morrer.
Eu filmei essa alimentação na França. Ela só acontece na última semana de vida dos patos, que antes vivem em um grande espaço onde vivem quase como se estivessem livres.
A produtora me explicou que por serem aves migratórias, guardam a comida no papo e consomem durante o dia, antes da próxima alimentação.



Não digo que seja uma maravilha, mas não vejo diferença do que se vê em matadouros pelo mundo afora.
O que me intriga é a falta do que fazer do vereador Laércio Benko (do PHS), dos nossos outros representantes, que aprovaram o projeto de lei e do prefeito Fernando Haddad (que inclusive aprecia o Foie Gras), que sancionou a lei contrariando o parecer de juristas que consideram o projeto inconstitucional.
Será que não existem coisas mais importantes?
Será que o Foie Gras é tão consumido assim na capital paulista para provocar tamanha preocupação com patinhos e gansinhos???
Dá vontade de plagiar o Ricardo Boechat e mandar essa gente procurar uma &%#$...

quinta-feira, junho 25, 2015

O ciúme não era maior do que o desejo de João - Conto




-Sai daqui.
Não quero te ver...
O desabafo era compreensivel.
Era mais do que compreensivel.
Marta saiu sem dar explicações, sumiu por 3 dias, voltou como se nada tivesse acontecido.
João Manuel era um cara que atraia pelo que sabia.
Sabia de tudo e como poucos.
Sabia de política, de esportes, de economia, de música, de arte, de tudo.
Tudo e mais um pouco.
Além disso não era de se jogar fora no quesito beleza física.
Martha era um espanto.
Alta, magra, cabelos loiros, olhos castanhos claros, corpo escultural.
Bunda, peitos... Tudo.
João não era ciumento.
Deixava Martha livre, mas 3 dias...
É muita coisa.
Martha saiu sem dizer nada.
João seguiu para os vinhedos e trabalhou como se nada tivesse acontecido.
Voltou, tomou banho, jantou, entrou no computador, deitou...
E onde estava Martha???
Lembrou do que havia acontecido e logo pegou o telemóvel: Martha... Onde você está?
-Me mandou embora e eu vim.
-Mandei naquele momento, não agora.
Martha pegou o carro e voltou.
Se falaram como se nada tivesse acontecido, se amaram como se nada tivesse acontecido e dormiram como anjos.
No dia seguinte João acordou e correu para o trabalho.
Engarrafamento da safra anterior, esvaziar tanques, colheita atual chegando...
Muita coisa.
Voltou no final da tarde.
Tomou banho, jantou...
Onde estava Martha?
Pegou o telefone e nem por isso conseguiu alguma coisa.
Fora de área.
Dormiu sozinho como um eremita.
Acordou, saiu para os vinhedos, pegou o telefone e ligou pra Martha.
-Desculpe amor. Não consigo contar o que aconteceu, só peço desculpas.
João voltou para casa. Tomou uma ducha (falam duche em Portugal) e abriu uma garrafa de vinho.
Tomou devagar, pensativo.
No dia seguinte voltou ao trabalho.
Na semana seguinte começou a colheita.
No mes seguinte Martha telefonou.
-João...
-Diga Martha.
-Posso voltar?
-Pode.

O Vinho e a Pintura - Jean Dupas (Baco) - 3



Vinha Grande - Douro 2022 - Casa Ferreirinh

Cereja, bergamota, violeta...  na boca tem corpo médio, taninos macios, sensação de frescor, sabor repetindo o nariz, mas com um toque de e...